Edu:
Por dever profissional, para concluir um trabalho recente, mantive contato com
a produção acadêmica do professor Hugo Lovisolo, antropólogo social pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Entre suas ideias, algumas defendidas
no livro 'A Invenção do País do Futebol', uma em especial afeta e incomoda todos
nós admiradores do futebol: o excesso de nostalgia deste meio. Torcedores
fanáticos ou simples admiradores, entre os que me incluo, estão sempre dizendo
que o futebol 'de antes' era melhor, que no tempo em que o futebol era mais
simples jogava-se melhor, que quando não havia tanta interferência do mercado e
da mídia o jogo era mais puro, mais autêntico. Lovisolo contesta com veemência
essa postura e propõe algumas questões, não exatamente com estas palavras. Por
que o futebol de hoje não pode ser bom e prazeroso pelo simples fato de que há
muito dinheiro em jogo? Por que o que era supostamente 'ingênuo' era melhor do
que é supostamente 'contaminado'? O futebol que se joga dentro do campo tem de
fato toda essa ligação com o mundo externo ou o verdadeiro apreciador do
futebol sabe diferenciar o que presta do que é daninho?
Carles: Vejo a questão por dois lados. O primeiro que o futebol é um desfrute
de ordem afetiva, ligado à falta de preocupações e portanto gravado na memória
de cada um, segundo uma época vivida sem culpa, digamos com mais
“irresponsabilidade” e portanto, reforçando sempre um determinado modelo no
subconsciente. Por isso o saudosismo com o futebol se parece à lembrança da
carambola saboreada no quintal da casa da avó. O outro, é o nosso velho e bom
assunto do mercantilismo que profissionaliza e portanto cria um compromisso de
excelência entre a parte contratante e a parte contratada, como diria Groucho; mas
em compensação padece do problema crônico da busca do lucro, a desmedida
ambição dos seus gestores, normalmente os menos apaixonados pela essência da
atividade. Acho que o problema nem é só se os rios de dinheiro são ou não
incompatíveis com uma prática eminentemente lúdica, mas a suspeita (incluindo
os que estão dentro) quase permanente que paira sobre tudo aquilo que move
sempre tanta grana e em que os jogos de interesses são a moeda corrente.
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